As pedaladas têm gostinho de superação quando você é criança. Difícil encontrar quem não se lembre com sorriso do dia em que o equilíbrio venceu e as rodinhas foram deixadas de lado. Sensação parecida aparece quando, para deixar de sofrer com o trânsito da cidade, muita gente resolve apostar na bike. Dispostas a vencer o desafio de enfrentar buracos, lombadas e motoristas impacientes, muitas pessoas procuram estímulo extra nos grupos de ciclismo. “Em turma, o entusiasmo e a segurança aumentam, favorecendo a prática”, afirma o professor Leandro Carvalho, que trabalha com treinamento e assessoria de corrida de rua e ciclismo.
Lívia Araújo começou tímida, arriscando pegar a bicicleta de vez em quando para ajudar na dieta. Tomou gosto pela brincadeira e ingressou no Massa Crítica, grupo de ciclistas urbanos de Porto Alegre (RS). A turma usa a bike como meio de transporte para a maioria dos deslocamentos e se reúne uma vez por mês para pedalar como diversão. “Hoje pedalo para o trabalho, faço passeios e também usa a bicicleta quando preciso fazer pequenas compras”, conta. Mas ainda não é fácil, existe uma guerra entre carros, motos e bicicletas. Lívia acredita que o espaço das bicicletas deve ser respeitado, sem imposição. “A cidade só tem a ganhar com mais ciclistas nas ruas”.
Ela conta que, no Massa Crítica, os novatos têm todo o apoio dos mais experientes quando há subidas e movimentos mais arriscados em ruas agitadas. Também faz parte da rotina do grupo a troca de informações sobre os cuidados mecânicos e sobre alimentação, tudo em nome de um dia a dia mais saudável. “No grupo, essas conversas são naturais, fazem parte da rotina. Você sente o clima de cooperação e, quando menos imagina, já se sente parte daquilo tudo, seus hábitos já foram completamente transformados pela bicicleta”.
Medo de ficar para trás
A regra, comum a todos os grupos, não deixa brecha para confusão. Nenhum ciclista deve ser deixado para trás e a descoberta de distâncias e percursos desafiadores precisa fazer parte da programação. “Não há espaço para desmotivação, nosso esforço é para que cada vez mais pessoas sintam os efeitos desta prática, sintam o quanto ela pode melhorar a qualidade de vida não só de quem pedala, mas também de quem tem a chance de viver numa cidade menos congestionada e menos poluída”, afirma Alessandro Della Giustina, da Associação dos Ciclousuários da Grande Florianópolis.
Em relação à segurança, optar por um grupo de ciclismo outra vantagem. “É muito mais difícil um motorista cometer uma imprudência e colocar em risco a vida de uma massa sobre rodas do que de um ciclista sozinho. E, no caso de quem pedala à noite, sempre há alguém que fazer companhia até em casa após o circuito”, lembra a ciclista Lívia, do Massa Crítica. No caso de haver acidente, o grupo consegue socorrer e providenciar todo suporte necessário muito mais facilmente, além de serem reduzidas as chances de assalto.
pedale em grupo
Guerra contra os carros
Aumentar a rede de amizades também fica mais fácil quando você entra para um grupo e passa a ganhar intimidade com esse modelo mais saudável e ecológico de circular por aí. “Você precisa prestar atenção em si e também nos outros, acompanhando o ritmo da turma e se adaptando às mudanças. É um exercício para o corpo e também para a mente”, afirma Maurício Soares Lima, do grupo Floripa Bikers, de Florianópolis (SC), que se reúne duas noites por semana para circular pela cidade.
Também existe quem aposte nas pedaladas para se afastar da rotina, como é o caso do movimento Pedala Joinville. “Nossos pedais são sempre para regiões rurais, sem pressão, barulho e livre dos perigos do trânsito. A gente aproveita mais o esporte e também fica mais fácil fazer novas amizades”, afirma Roberto Andrich, integrante do grupo.
Mas quem experimenta garante que o difícil mesmo é reservar somente algumas ocasiões para as pedaladas. Willian Cruz não aguentava mais dirigir em São Paulo e, há sete anos, trocou seu carro por uma bicicleta. “Conheço os riscos. Mas acho que o grupo tem um papel importante nisso, a pessoa vai ganhando segurança para cair nas ruas sozinho quando não é dia de pedalar com a turma”.
Por outro lado, o grupo também ensina os ciclistas a respeitarem os carros e as motocicletas. Uma lição importante quando se tem em conta o número reduzido de ciclovias que cortam as vias urbanas. “Oferecer passagem, prestar atenção nos sinais de trânsito e evitar a competição com os outros veículos são práticas de grupo que tornam-se naturais quando você está pedalando